O quinto ano da série narra a fuga dos sobreviventes do Terminus e, consequentemente, a sua busca por um refúgio sob a liderança de Rick Grimes e a descoberta de uma possível cura para o vírus zumbi pelo Dr. Eugene Porter. A célebre Zona Segura de Alexandria é a principal condutora de acontecimentos da segunda metade da temporada.
Tratando-se da primeira vez que escrevo sobre a série para o site, parece-me relevante adiantar a minha posição quanto à ela. Sou um fiel leitor dos quadrinhos, porém compreendo as alterações e diferenças de rumos tomadas pela adaptação televisiva. Vejo, inclusive, diversos pontos em que a série é suave ou extremamente superior aos quadrinhos, como na retratação do Governador (que na TV é um ser humano e não o mal personificado) ou Carol. E sou um dos que não gostam de Daryl por acreditar que o seu texto, que mais valoriza o estilo do que a verossimiilhança, é ruim.
Dito isto, sinto que já podemos começar a falar sobre a quinta temporada.
The Walking Dead não é uma série fantástica. Nunca foi. Acima da média se comparada à programação da televisão aberta americana, talvez. É uma visão singular e cativante da sobrevivência em terras desoladas e infestadas de mortos-vivos, sem dúvidas. Consegue prender o espectador mesmo no seu pior episódio pelo mesmo motivo que o faz nos bons episódios: os personagens. Rick e o seu grupo são, no geral, ótimos personagens. Alguns complexos, como o próprio Rick e Carol, outros nem tanto, como Daryl e Abraham.
Os episódios em estilo antologia são ótimos para refrescar a experiência e desenvolver personagens menores. É reconfortante que a equipe de produção conheça as fraquezas da série e que procurem cobri-las com uma estrutura narrativa mais inusitada. Só espero que na próxima temporada vejamos o apocalipse zumbi pelas perspectivas de Michonne, Tara e, mais uma vez, Carl, pois é o meu personagem predileto dos quadrinhos.
Então sim, os personagens sempre foram o ponto-chave que salva a série do cancelamento, ano após ano, além, é claro, dos zumbis comendo miolos e das trocas de tiros que a audiência adora. A quinta temporada se edifica sobre este conceito básico, de que The Walking Dead não seria nada se não fosse pelos seus personagens.
O arco do Terminus foi excitante e tenso, porém, no tocante ao potencial, desperdiçou muito. Os Caçadores foram elevados a vilões de grande porte somente para, logo no season premiere, serem derrotados. E dois episódios depois, exterminados. Também não foram humanizados. Colocá-los como vítimas num passado trágico não é humanizar e não funciona para justificar a sua própria maldade, é apenas preguiça criativa. Com muito gosto eu abriria mão de Dawn, Beth e o hospital em troca de uma temporada que discutisse a temática antropófaga. Todo o material promocional da série representou os sobreviventes como prisioneiros e não tivemos sequer um episódio inteiro sob esta ótica. Patético.
Quando a série retorna do hiatus, parece voltar cheia de pretensão. O próprio roteiro encontra uma maneira de declarar ao espectador ‘que está melhor agora’. Apesar da afirmação, o episódio da morte de Tyreese é bastante excessivo, contorcido sob inúmeros filtros e efeitos de imagem dignos de um usuário do tumblr. Mas, pretensiosa ou não, volta muito bem. Melhor do que antes, aliás.
Os argumentistas parecem traumatizados com a repercussão da segunda temporada, uma vez que procuram fazer de tudo para manter um ritmo estratégico na segunda metade da quinta. Se tivermos dois episódios reflexivos e concentrados na construção dos personagens, o episódio a seguir deverá ser action packed. Covarde (pelo menos para mim, que não tive dificuldade em digerir a saga da fazenda de Hershel).
Algumas observações deslocadas: 1. Onde está Jesus? Se não o tiverem introduzido por culpa do Daryl, eu definitivamente não vou perdoar Scott M. Gimple. 2. O padre Gabriel é simplesmente insuportável. 3. Como tiveram a audácia de combinar Daryl com uma motocicleta novamente, eu não sei. Suponho que já não há como tornar o personagem mais caricato, de qualquer forma. 4. Sasha também é simplesmente insuportável. 5. Carol se camuflando como uma dona de casa indefesa na comunidade foi brilhante. 6. O mistério dos ‘Wolves’ (que torço para que sejam Negan e Os Salvadores), que começou de modo inesperadamente inteligente, acabou escrachado demais. 7. O maior erro da temporada foi não ter guardado o discurso de ‘we are the walking dead’ para a revolta de Rick em Alexandria.
Voltando à programação normal.
Esta é a maior temporada dos zumbis de papel. A não ser quando é conveniente para o roteiro (para matar alguém descartável ou interromper uma briga), os zumbis são folhas de papel ensopadas de sangue, facilmente rasgadas por correntes ou cabos de vassoura. Em alguns momentos deixa de ser bobo e passa a ser patético.
A morte de Noah é a mais chocante, desagradável e cruel do ano. Ver o pobre rapaz ser dilacerado na porta giratória enquanto Glenn assiste foi capaz de fazer o espectador com menos simpatia pelo personagem sentir compaixão. A de Beth, Bob e Tyreese foram mais importantes, mas bem menos surpreendentes. Chega a ser petulante. Só o novato teve direito a uma morte genuínamente violenta. E o processo de inclusão de minorias e de promoção da diversidade em The Walking Dead é, para dizer pouco, estranho. Dois homens negros não podem coexistir no grupo de Rick, o que está há mais tempo tem de morrer.
Na missão (que chegou tarde) de ser fidedigna às histórias em quadrinhos originais, em Alexandria nós conhecemos Jess e sua família. O problema é que a série perde a oportunidade de compensar pelo erro que cometeu em arruinar e matar Andrea. Se Jess – que em múltiplas ocasiões diz que pode cuidar de si mesma, e já tem a aparência de Andrea e o amor de Rick – se tornasse a nova Andrea, seria ótimo. Afinal, o lugar de Andrea foi ocupado por Sasha e eu não estou minimamente contente com isso.
Deveria seguir os quadrinhos não só com Jess, o padre Gabriel ou Os Caçadores, deve-se apontar. Está bem, eu espero que a série mantenha o seu caminho original, mas é indispensável que Carl perca o seu olho direito (o que muito provavelmente não acontecerá). E já que a morte de Glenn já foi teased logo no primeiro episódio da temporada, que Negan espanque Daryl até a morte com o seu taco de beisebol e não ele. Se tivessemos mais alguns episódios para construir a ameaça d’ Os Salvadores, seria o season finale perfeito (não que não tenha sido ótimo)
Só que nada é perfeito em The Walking Dead. Não importa o quanto a série evolua em direção, argumento e performances, sempre existirá entre ela e a perfeição um enorme vão de estranheza, essencialmente por ser tão covarde e se negar a não dar ao espectador tradicional – que protesta contra a morte de Daryl ameaçando abandonar a série – o que ele quer. A quinta temporada (talvez o melhor ano do seu breve histórico), embora traga um sentido de perigo e horror que há muito fazia falta e seja uma das mais eficientes na matéria de estudo de personagens, não é fantástica, não como poderia ter sido. Uma das experiências televisivas mais viciantes da atualidade, sem dúvidas, porém que se situa entre o mediano e o bom, sendo honesto.
Mas já é um começo. Um ótimo começo.
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